Estudo Revela Detalhes Alarmantes sobre a Violência de Gênero
Oeste Global | Luís Carlos Nunes – Um levantamento inédito realizado pelo Instituto Sou da Paz expõe a cruel realidade da violência de gênero no Brasil, revelando que, em 2022, 50% das mulheres assassinadas no país foram vítimas de armas de fogo. O terceiro relatório do Instituto destaca que o crime, em sua maioria, tem como autor uma pessoa próxima à vítima, sendo 28% parceiros íntimos, 9% amigos ou conhecidos, e 6% familiares.
Os dados, consolidados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema Nacional de Vigilância de Agravos de Notificação (Sinan) no período de 2012 a 2022, revelam que 60% das mortes ocorreram entre mulheres de 20 a 39 anos. Além disso, sete em cada dez mulheres assassinadas no Brasil são negras (considerando negras e pardas).
O estudo também destaca que as armas de fogo estão frequentemente associadas a agressões físicas (52%), seguidas por agressões psicológicas (22%) e, por fim, agressões sexuais (15%) em casos de violência ocorridos em 2022.
Em média, as armas de fogo foram responsáveis pela morte de 2.200 mulheres a cada ano no Brasil durante o período analisado, equivalendo a seis mortes por dia. O ápice de homicídios foi registrado em 2017, com 4.928 mulheres assassinadas, marcado por conflitos entre facções pelo controle de rotas de tráfico de drogas no Norte e Nordeste.
Desde então, os números de homicídios de mulheres têm diminuído anualmente, atingindo 3.844 vítimas em 2021 e 3.788 em 2022. No entanto, a violência armada não letal, representando casos em que as mulheres foram feridas, aumentou para 3.793 casos em 2022, superando os 3.304 casos do ano anterior.
A análise dos locais dos crimes revela uma preocupante tendência: a taxa de mulheres mortas dentro de casa vítimas de armas de fogo tem crescido nos últimos anos, passando de 19% em 2012 para 27% em 2022.
Comparando a vulnerabilidade de mulheres negras e não negras à violência armada, constata-se que 45% dos assassinatos de mulheres negras ocorreram em vias públicas, contra 24% dentro de casa. Já entre mulheres não negras, o risco de morte por agressão com arma dentro e fora de casa é mais equilibrado, com 33% em via pública e 34% dentro de casa.
As regiões Nordeste e Norte apresentam as maiores taxas de homicídios femininos por arma de fogo, com taxas de mortes de 3 e 2,6 a cada 100 mil habitantes, respectivamente. Destacam-se negativamente o Ceará (4,3), Rondônia (3,9) e Bahia (3,6) como os estados com as piores taxas.
A socióloga Cristina Neme, coordenadora de projetos no Instituto Sou da Paz, destaca que o relatório evidencia um problema estrutural persistente, alertando sobre o risco de morte para as mulheres em situação de vulnerabilidade devido ao acesso às armas.
Pela primeira vez, o estudo inclui dados sobre o consumo de álcool e violência armada em 2022. Surpreendentemente, 25% das notificações de violência armada não letal indicam suspeita de que o agressor consumiu álcool, sendo que essa taxa sobe para 35% nos casos ocorridos dentro de casa.
Marina Ganzarolli, presidente e fundadora do Me Too Brasil, ressalta que a pesquisa evidencia como o lar continua sendo o lugar mais perigoso para as mulheres brasileiras. Ela destaca que a maioria dos agressores faz parte do círculo social afetivo da vítima, ressaltando a necessidade de melhorar o bem-estar subjetivo da população, incluindo emprego, rede de apoio e acesso ao acolhimento familiar.
Ganzarolli também aponta a necessidade de investimentos para garantir o efetivo cumprimento das leis existentes, destacando a importância de delegacias especializadas e estrutura adequada para o atendimento às vítimas. Ela enfatiza que, embora as leis sejam sólidas, o gargalo está no acesso a uma investigação adequada e ao suporte necessário.